11 de setembro de 2012

Elegia à Ilha de Maré


Elegia à Ilha de Maré

É inverno na maré.
O mar se dilata, taciturno, feito um olho.
A noite emerge do farto seio marinho,
Da guelra do palhaço,

Da chispa do naufrago.
Sorridente, o mar sonha e chama os anjos.

Para a baía que é como um celeste tangível.
Contemplo a cuia de Deus
E de todos os santos que morrem
Pelas mãos salgadas de suas ondas.

E escuto solene
A algazarra divina, o marinheiro
Que a preta criou ao mar na furtiva crença,
Na ignota esperança que é a vida.

E procuro triste
Nos segredos mais nefastos do horizonte
A centelha exata que se lhe esconde
Dentre as luzes exaustas que me afligem.

Pois, imagino, Salvador é como um trem
Com suas infinitas luzes decorando a madrugada
Em vagões enfileirados de casas e shoppings
Que então, na Barra, se lhe descarrilam
E o último vagão explode em fagulha tão viva
Que os destroços se espalham em sumarentas estrelas.

E se assim é,
Em que janela te rufas os dedos
Dentre estas que resplandecem raquíticas,
Amarelas e doentes?

E quando contemplas o batelão reservado
Abater barbatanas, ostras e meninas
E volta, na rede, tão pouco, e quando
Observas a tímida ilha, que pensas

De mim? Sentado na mureta fria
Eu devaneio, incoerente e retesado
E sinto frio, muito frio
Quando a maré se faz cheia
Bem no canto do meu olho.

Salvador, 11 de Setembro de 2012


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