5 de junho de 2013

O Último Minuto Da Testemunha



O ultimo minuto da testemunha

   Eu não vi a bala consumar coisa alguma. Ouvi apenas o grito engasgado, escutei tão somente o sangue marulhar na garganta desesperada. Nem um gemido a mais que isso. Nenhum sinal da morte, embora visse as marcas de seu batom róseo no corpo distendido. Nenhuma diferença entre o homem de outrora e o cadáver deste instante.

   Conjecturo a fuga; logo desisto. Não há rota alguma que prive meu tórax da bala. Estive muito perto de onde ninguém deveria estar; vi e ouvi um capitulo que deveria ocultar-se de tudo e de todos, e ser tão somente manchete no dia seguinte, se por sorte achassem o corpo.

   E se, ainda por sorte, tivesse eu pego a rua adjacente? Eu imagino: amanhã iria ler esta morte e me compadecer. Reclamaria, talvez, de como a capital está violenta ultimamente. De qualquer modo, não sentiria a despresença agonizante da morte; de qualquer modo, não tremeria ante a proximidade infame de seu vislumbre. Oh, ser-me-ia tão bom...

   Os bandidos me cercam. Imploro, mas me falta esperança no clamor. Como antes dito, a morte impende; brota de mim, então, o íntimo desejo de descobri-la, de ser objeto de seu ofício. Seria, talvez, eu um covarde? Possivelmente. Entretanto, que mais posso fazer, senão especular a minha forma póstuma, senão imaginar se serei realmente algo ou se hei de desvanecer no vazio?

   Em meu peito, flameja uma ansiedade por transcender à hora. Trocar, quiçá, a permanência científica do tempo pelo absurdo atemporal do infinito.

   Eles partem-me as juntas, eu tombo de joelhos. Um beijo incólume do cano na nuca.

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