Vidro temperado
De longínquas terras sussurram indústrias
Chaminés tragam o belo e expiram fumaça.
Ó vento, sopro divino, imaculado!
Por que trazes até mim tanta desgraça?
Como bestas, construções brigam entre si
Numa nauseante, intensa busca ao céu.
E por entre becos e vielas, fico eu a procurar
Fragmentos de lembranças, gotas de um mel...
Um mel que há muito, azedo se fez
E só o gosto de fuligem agora é vivo.
Como hei de alcançar tempos tão distantes,
Se até o sol, hoje vive escondido?
Ao fim da tarde, o lusco-fusco só se vê
Nas altas construções e nos seus vidros.
Tão castanhos... Como os dois olhos dela
Mesmo brilho! Mesmo brilho!
Será que se eu ainda os tivesse
Seria o céu tão cinza assim?
Seus olhos, se ainda brilhassem,
O que fariam de mim?
Descem arcanjos do céu, limpos até os pés!
E as angustias fluem da água para a chama.
Temperança é tempo que se passa e tudo leva
E a esmola que ele deixa é só lembrança.
Na minha mente, dois olhos muito castanhos.
Vou seguindo a fila do banco, do caixa, da prisão.
E em dias cinzentos e tão muito estranhos
Respiro poeira de paz, de sossego, e do algodão...
Do algodão que lhe forjava o vestido
Branco como as nuvens costumavam ser.
Teço fios e mais fios de disfarces tão modestos
Que poucos homens ousariam querer.
Pende minha cabeça no vidro estraçalhado
O sangue se derrama e escorre em seu enlaço.
Meu mel, feridas humanas são simples percalços
Para quem, desde sempre, sangrou ao seu lado.
Tão profundos
São os cortes
De fino vidro
Temperado.
Ruukasu... Você se superou totalmente... Pra quem ficou muito impressionado com a estrutura de Menina brasil, Vidro Temperado é uma dadiva dos céus...
ResponderExcluirMeus parabéns. Sério... Ficou Divino... A forma como expressou as idéias e o contexto que ele segue... as metaforas empregadas, e seu fim harmonico e impregnado de força, torna-o impactante aos olhos do leitor. E teu vocabulário colossal faz com que isso seja ainda mais bem passado.
Meu parabéns... de verdade!
A Estrofe que mais gostei:
"Um mel que há muito, azedo se fez
E só o gosto de fuligem agora é vivo.
Como hei de alcançar tempos tão distantes,
Se até o sol, hoje vive escondido?"
Achei que, junto da penultima estrofe esta foi a mais harmonica. Realmente, a forma como foi passado... embora eu trocaria azedo por "Fél"
^^
mas ficou divino..
bem, o unico ponto negativo que achei, foram as harmonias da estrofe... que não seguem nenhum tipo de forma... Poemas são como Desenhos, é preciso que você distribua os traços de forma a deixá-los ter uma boa postura, do contrario, são como arte abstrata, e muitas vezes não brilham tanto. Por isso deve distribuir as cores, os "traços" de forma harmonica, criando uma reação ao leitor do tal.
^^ mas isso é só detalhe... o que importa é, está impecável. meus parabéns, e continue com esse trabalho ^^
peço desculpas a demora de postar por aqui D: como sabes, sou muito enrolado e_e