29 de fevereiro de 2012

Um certo corpo Barroco


Um certo corpo Barroco

De alva tez, suspiravas o vento
Tão fresca brisa que soprava o milharal
E em teu rosto de cor, corou-se o frêmito
Tão bom amor sob o dormir celestial

É hoje teu corpo duro tal madeira
Como a turquesa pedra que te dei da sorte
Teu corpo frio, que ainda à rosa cheira
Cheiro onde vibra o fino o tom da morte.

Vou-me à memória onde tudo é mais bonito
Teu corpo é quente cabelo feito milharal
Tão louros cachos, o turquesa vem surgindo
Sobre a colina numa aurora matinal

E os montes louros que em teu ventre se aprumavam
Ao toque meu longo gemido se extraí
Timbre alquebrado, o tal gemido de alcova
Faz mesmo som que a alma faz quando se esvai

E os caracóis presos ao céu em um cordão
A nuca nua inteira de se arrepiar
E os olhos vivos cor de caldo de cana verde
E os lábios finos que me tentam a pecar

Foram dois dias, quase um ano, em um mês
Quiçá foi mais do que se possa mensurar
Sob o feno, o grão de trigo, o leito morno
Dois corpos rijos em um só transfigurar

Pois o seu busto não mais sobe nem mais desce
A sete palmos em um instante vai estar
Demoro longo em um beijo esquecido
Guardando o doce do que não vou mais beijar;

E amanhã ver a abobada do sol alvorecer
Como fazer para de ti não me lembrar?
Quiçá minha vida não é nada sem você.
Sem ter o loiro pelo seu para afagar

A dor é firme como a dor em minhas pernas
Um cheiro doce de alecrim e cravo há
Nem uma filha me deixaste de consolo,
Só uma foto que o tempo há de apagar.

A tampa fecha em um surdo solavanco
Tua casa agora é de madeira não há janelas
Mas sofre mesmo é quem fica em cima
Enterrado pelo passado dela.

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